Por Eduardo Müller Saboia, MSc
Na
Rio 2016 o Brasil teve a oportunidade de mostrar para mais de 4 bilhões de
habitantes a sua cultura, sua natureza exuberante e única, sua força de
realização mesmo em situações adversas, a alegria de sorrir em face de
problemas e a vontade de chorar diante da beleza. Somos assim, difíceis de
compreender, profissionais do “jeitinho” e de um improviso que chega a dar frio
na barriga. Realizamos com poucos recursos e por muitas vezes realizamos pouco.
Mas somos únicos, sentimos “saudade”, que povo nenhum pode expressar por não
existir esta deliciosa palavra em outros idiomas. Um sonho intenso, um amor
eterno, mas que por vezes fica deitado eternamente em berço esplêndido esperando
que milagres aconteçam.
O
brasileiro tem orgulho em dizer que alimenta o mundo. O Brasil é o primeiro em
produção e exportação de açúcar, café e suco de laranja. É o primeiro em
exportação e é o segundo em produção de soja, carne bovina, tabaco e carne de
frango. Segundo em exportação e terceiro em produção de etanol e milho. Quarto
em carnes de peru e suínos. No geral, é o quarto maior exportador mundial. O Agro
representa 21% do PIB e 46% da balança comercial. 7% do mercado mundial do Agro
é brasileiro. Também emprega 35% da mão-de-obra brasileira mesmo preservando
61% do seu território. Um orgulho imenso. Potencial que não acaba mais.
Mas
nem tudo é “Agro-ostentação”, algo pode estar errado. O Brasil não é
competitivo em 58% dos produtos agrícolas comercializados. E não é em produtos
que deveria nadar de braçada pela exuberância e variedade que tem em seu
território: pescados, frutas, bebidas, cereais e farinhas, produtos oleaginosos
(exclui-se soja), hortícolas, leguminosas, raízes e tubérculos, além de
lácteos. Em todas estas variedades, o Brasil tem menos de 1% de participação do
mercado mundial. Que pena! Rios e faixa litorânea, terras, recursos hídricos
para irrigação e clima adequado temos de sobra em todas as regiões do norte ao
sul, do leste ao oeste.
Há
um potencial enorme de crescimento em todos estes segmentos, tanto nos que já
vamos bem quanto nos que ainda patinamos. O mundo precisará de muito mais
alimentos. Estima-se que em 2050 serão mais de 9 bilhões de habitantes. Ao
considerar os meios atuais de produção, o Brasil é o único país a ter todas as
condições para fazer frente a esta demanda: recursos hídricos, relevo, área de
expansão suficiente e temperatura ideal. Mas o jogo não está ganho, há muito
trabalho a ser feito. E se alguns entraves não forem eliminados, o país perderá
novamente a grande e talvez única chance de prosperar e de se tornar líder
mundial em produção e beneficiamento de alimentos.
O
Brasil peca ao fazer poucos acordos comerciais com outros blocos e países. O comércio
entre blocos antes representava 20%, hoje representa 40% do comércio de
alimentos. Quem estiver fora terá muitas dificuldades de se tornar competitivo.
O
Brasil peca ao permitir que o Censo Agropecuário seja postergado e postergado
por “falta” de recursos para realiza-lo. O Agro brasileiro mudou muito nos
últimos dez anos. A falta de um censo faz com que as políticas públicas de
incentivo sejam aplicadas de maneira errada.
O
Brasil peca por ser negligente, relapso, irresponsável e ineficiente com a sua
logística. É capaz de achar normal que 30% dos grãos plantados e colhidos sejam
perdidos em armazéns mal conservados ou em transportes de má qualidade, tanto em
modal ferroviário, fluvial e rodoviário.
O
Brasil peca por não regulamentar as regras e leis que precisam ser definidas para
que os produtores possam trabalhar com menos recursos, mais segurança e de
forma sustentável. Por vezes, detém a tecnologia, mas ela não funciona por
falta de regulamentação.
O
Brasil peca por ser tímido em iniciativas de sustentabilidade. Mesmo que
algumas empresas como EMPRAPA estejam fazendo excelentes trabalhos neste
sentido, falta vontade política para massificar as vertentes tecnológicas
essenciais para o Agro do futuro próximo: biologia sintética, nanotecnologia,
ômicas, robótica, agricultura de precisão e também a agricultura vertical.
O
Brasil peca por não priorizar a discussão, em todas as esferas da sociedade, da
quarta revolução industrial que chegou para ficar. É preciso priorizar, antes
que não dê mais tempo, o desenvolvimento e a implantação massiva das
tecnologias desruptivas, como o uso no Agro de veículos autônomos, inteligência
artificial e robótica, redes de internet móveis no campo que funcionem
adequadamente, computação em nuvem que permita o processamento de uma
quantidade enorme de dados (big data) e o uso de drones e energias renováveis. Sem
isso, sem logística competitiva e sem acordos comerciais favoráveis, o Brasil possivelmente
perderá a chance de se tornar o principal player
da indústria do Agro, e não será mais a única nação com potencial de suprir a
demanda por alimentos do mundo.
Estamos
preparados? No Agro não existe o “jeitinho”, só para lembrar...
Fica a reflexão!
