segunda-feira, 24 de julho de 2017

O tiro na testa que o brasileiro ainda não levou e precisa levar.


Por Eduardo Müller Saboia, MSc.

Ao ver o noticiário nas últimas semanas, lembrei-me de um livro que tive que ler para o vestibular: O Triste Fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto, escrito em 1911. Para quem não conhece ou não se lembra da narrativa, conta a história de um personagem patriota, ímpar, nacionalista ao extremo, estranho para a vizinhança justo pelos seus ideais, que acredita no Brasil como o melhor, o país do futuro. Cada ação dele volta-se para este objetivo maior, de ver sua pátria prosperar e produzir.
Mas Policarpo Quaresma não viu isso acontecer e foi considerado traidor da pátria pela República. Esta mesma República antiética e covarde que se vê hoje. Morreu na prisão pensando no quanto havia sido ingênuo e que levara sua vida em vão.
E quando leio frases dos atuais políticos brasileiros, do estilo "se eu for preso, não vale a pena ser honesto no Brasil", ou então "ninguém tem mais autoridade moral e ética do que eu para transformar a luta contra a corrupção não em bandeira, mas em uma prática cotidiana", me sinto um tanto Policarpo. A impressão que dá é que eu, pagador assíduo dos mais variados impostos, lutador e gerador de PIB, sou o errado, o estranho da vizinhança, o traidor ingênuo que leva uma vida em vão.
Defender a ética é defender o bem comum. Simples assim. Somente posso ser considerado ético se as minhas ações estão focadas para o bem de todos. Tudo o que não encontramos mais neste país, seja em esferas governamentais, empresariais, de serviços ou produção, é a ética. A bagunça é generalizada. O bem comum e fundamental foi esquecido e o Brasil faliu neste quesito e em tantos outros.
Recentemente a Noruega nos deu uma lição de ética e moral ao cancelar recursos para a defesa do meio ambiente e a nos cobrar medidas efetivas contra a corrupção. Até que isso aconteça, o cheque fica sustado.
Também em recente pesquisa divulgada pelo jornal Folha de São Paulo, a pedido do ETCO (Instituto de Ética Concorrencial), 90% dos jovens entre 14 e 24 anos avaliam a sociedade brasileira como nada ou pouco ética. A pesquisa foi feita em 130 cidades espalhadas pelo país. O percentual melhorou um pouco quando o entrevistado se auto avaliou, ou quando comentou sobre familiares e amigos. Mas não é menor que 57%. Os menos éticos, segundo os entrevistados, são os políticos, empresários e policiais militares, respectivamente, responsáveis pela nossa gestão e elaboração das leis, oferta de produtos e serviços e nossa segurança. E para quem acha que adolescentes e jovens não sabem o que é ética, a resposta mais comum foi de "respeitar o próximo". Só isso.
A graduada em Letras, Natacha Bastos, descreve com perfeição no site G1: "O brasileiro Policarpo, que tanto acreditava em mudanças e melhoras, que tanto valorizava o que de mais brasileiro havia, acaba sendo acusado de traidor, e morre na prisão. Ele, antes de sua morte, chega à conclusão que toda a sua vida, sua luta e todos seus sonhos foram em vão. A pátria brasileira, pela qual ele tanto sonhou e lutou, não existia."
Pode-se completar: a pátria brasileira, pela qual eu tanto sonho e luto, também não existe mais. Que ainda haja tempo do país tomar um tiro na testa, perder a memória e reaprender novos hábitos, semelhante ao personagem de Harisson Ford, Henry Turner***, no filme Regarding Henry (1991). Precisamos acordar, reavaliar, rediscutir, refazer, reaprender, reiniciar, reestruturar, voltar a sonhar, re, re, re, re este país. Da maneira como está, não dá mais!
Basta! Salve-se quem puder! O bem comum está sendo violentado diariamente em todas as esferas da sociedade e parece não haver mais solução sem um choque, uma ruptura ou revolução de verdade. É passada a hora de acordarmos feridos e sem memória, para um recomeço, para o novo, definitivamente ético e voltado para todos. É passada a hora de honrarmos a morte e os ideais patriotas do saudoso Policarpo Quaresma.
Acorda Brasil! Não podes ser gigante somente pela própria natureza! Estás morrendo para seus filhos! Orai e vigiai!

Fica a reflexão!

*** Henry Turner é um advogado de julgamento desprezível e implacável cuja vida é virada de cabeça para baixo quando ele foi baleado na cabeça durante um assalto. Ele sobrevive à lesão com danos cerebrais significativos e deve re-aprender a falar, andar e funcionar normalmente. Ele também perdeu a maior parte da memória de sua vida pessoal e deve se adaptar à vida com a família que ele não lembra. Para a surpresa de sua esposa e filha, Henry se torna um homem amoroso e afetuoso.

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