Por Eduardo Müller
Saboia, MSc.
Ao ver o noticiário nas últimas semanas, lembrei-me de um livro que tive
que ler para o vestibular: O Triste Fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto,
escrito em 1911. Para quem não conhece ou não se lembra da narrativa, conta a
história de um personagem patriota, ímpar, nacionalista ao extremo, estranho
para a vizinhança justo pelos seus ideais, que acredita no Brasil como o
melhor, o país do futuro. Cada ação dele volta-se para este objetivo maior, de
ver sua pátria prosperar e produzir.
Mas Policarpo Quaresma não viu isso acontecer e foi considerado traidor
da pátria pela República. Esta mesma República antiética e covarde que se vê
hoje. Morreu na prisão pensando no quanto havia sido ingênuo e que levara sua
vida em vão.
E quando leio frases dos atuais políticos brasileiros, do estilo
"se eu for preso, não vale a pena ser honesto no Brasil", ou então
"ninguém tem mais autoridade moral e ética do que eu para transformar a
luta contra a corrupção não em bandeira, mas em uma prática cotidiana", me
sinto um tanto Policarpo. A impressão que dá é que eu, pagador assíduo dos mais
variados impostos, lutador e gerador de PIB, sou o errado, o estranho da
vizinhança, o traidor ingênuo que leva uma vida em vão.
Defender a ética é defender o bem comum. Simples assim. Somente posso
ser considerado ético se as minhas ações estão focadas para o bem de todos.
Tudo o que não encontramos mais neste país, seja em esferas governamentais,
empresariais, de serviços ou produção, é a ética. A bagunça é generalizada. O
bem comum e fundamental foi esquecido e o Brasil faliu neste quesito e em
tantos outros.
Recentemente a Noruega nos deu uma lição de ética e moral ao cancelar
recursos para a defesa do meio ambiente e a nos cobrar medidas efetivas contra
a corrupção. Até que isso aconteça, o cheque fica sustado.
Também em recente pesquisa divulgada pelo jornal Folha de São Paulo, a
pedido do ETCO (Instituto de Ética Concorrencial), 90% dos jovens entre 14 e 24
anos avaliam a sociedade brasileira como nada ou pouco ética. A pesquisa foi
feita em 130 cidades espalhadas pelo país. O percentual melhorou um pouco
quando o entrevistado se auto avaliou, ou quando comentou sobre familiares e
amigos. Mas não é menor que 57%. Os menos éticos, segundo os entrevistados, são
os políticos, empresários e policiais militares, respectivamente, responsáveis
pela nossa gestão e elaboração das leis, oferta de produtos e serviços e nossa
segurança. E para quem acha que adolescentes e jovens não sabem o que é ética,
a resposta mais comum foi de "respeitar o próximo". Só isso.
A graduada em Letras, Natacha Bastos, descreve com perfeição no site G1:
"O brasileiro Policarpo, que tanto acreditava em mudanças e melhoras, que
tanto valorizava o que de mais brasileiro havia, acaba sendo acusado de
traidor, e morre na prisão. Ele, antes de sua morte, chega à conclusão que toda
a sua vida, sua luta e todos seus sonhos foram em vão. A pátria brasileira,
pela qual ele tanto sonhou e lutou, não existia."
Pode-se completar: a pátria brasileira, pela qual eu tanto sonho e luto,
também não existe mais. Que ainda haja tempo do país tomar um tiro na testa,
perder a memória e reaprender novos hábitos, semelhante ao personagem de
Harisson Ford, Henry Turner***, no filme Regarding
Henry (1991). Precisamos acordar, reavaliar, rediscutir, refazer, reaprender,
reiniciar, reestruturar, voltar a sonhar, re, re, re, re este país. Da maneira
como está, não dá mais!
Basta! Salve-se quem puder! O bem comum está sendo violentado
diariamente em todas as esferas da sociedade e parece não haver mais solução
sem um choque, uma ruptura ou revolução de verdade. É passada a hora de acordarmos
feridos e sem memória, para um recomeço, para o novo, definitivamente ético e
voltado para todos. É passada a hora de honrarmos a morte e os ideais patriotas
do saudoso Policarpo Quaresma.
Acorda Brasil! Não podes ser gigante somente pela própria natureza!
Estás morrendo para seus filhos! Orai e vigiai!
Fica a
reflexão!
***
Henry Turner é um advogado de julgamento desprezível e implacável cuja vida é
virada de cabeça para baixo quando ele foi baleado na cabeça durante um
assalto. Ele sobrevive à lesão com danos cerebrais significativos e deve
re-aprender a falar, andar e funcionar normalmente. Ele também perdeu a maior
parte da memória de sua vida pessoal e deve se adaptar à vida com a família que
ele não lembra. Para a surpresa de sua esposa e filha, Henry se torna um homem
amoroso e afetuoso.

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